Quais os sentidos que permeiam a queima da Amazônia?

Você já refletiu que assim como estamos nos relacionando coletivamente com a terra que é a feminilidade arquetípica, estamos nos relacionando com todo o feminino?

Existe uma imagem coletiva de mãe que nos dá alguns sentido como: a sempre  cuidadora, doadora, aquela que se sacrifica pelos seus filhos e filhas. Nesse sentido, quando falamos mãe natureza ou mãe Terra acreditamos que tudo que está relacionado a mãe também está relacionado a terra e a natureza. Assim, passamos a acreditar que ela deve tudo nos dar, proteger, nutrir, que ela está toda disponível para nós e sua única função seria criar e sustentar a vida.

E o que nós fazermos? Adentramos em seu ventre sagrado, devastamos e poluímos, exploramos até a última gota até deixá-la completamente estéril, afinal algo em nós acredita ser nosso direito fazer isso, até porque o sentindo da vida e existência dela é apenas a servidão.

Se você quiser saber mais sobre isso que estou falando, se parece uma conversa de gente “hippie”, recomendo que leia mais sobre ecofeminismo. Segundo Vanda Shiva, o ecofeminismo é o reconhecimento de que as forças que marginalizam, dominam e oprimem a natureza são as mesmas forças que marginalizam e oprimem as mulheres.

Diante disso é fácil compreender que a maior floresta tropical do mundo é tratada da mesma maneira que a sociedade brasileira tem tratado suas mulheres. Todos os dias é um novo escândalo que por vezes nos faz pensar que retrocedemos séculos no tempo. Séculos é o que a Amazônia precisará para se recuperar também dessa ferida.Aproveito para te trazer alguns sentidos que permeiam a queima da Amazônia.

Imagem: @gabrielatornai_

O nome Amazônia é uma homenagem às amazonas, um conhecido mito grego de mulheres guerreiras. Vocês conhecem uma delas: A Mulher Maravilha, um dos grandes ícones da cultura pop feminista é baseado na princesa Diana das Amazonas.

Quando os invasores, espanhóis, aqui chegaram avistaram mulheres, nuas, que seguravam firmemente suas armas em defesa da terra e de seus próprios corpos. Em contraste com o referencial de mulher europeia que tinham, representadas como seres mentalmente, moralmente e fisicamente frágeis logo, eles pensaram, as amazonas existem!

Eram as icamiabas, mulheres que destoavam do próprio “padrão” feminino estabelecido pelos povos de cá. Eram mulheres altas, musculosas de longos cabelos negros, viviam isoladas e não permitiam a presença de homens e para afastá-los usavam com destreza seus arcos e flechas.

As amazonas brasileiras simbolizavam o último avatar das mulheres guerreiras. Seus corpos poderosos são imagem livre e invertida das mulheres domesticadas. Antítese das “verdadeiras” mulheres, as Amazonas são guerreiras, ativas, fortes e bravas. Independentes, homossexuais talvez, seriam elas a encarnação do “mal” latente no feminino?

Indomáveis, ferozes, selvagens, impenetráveis, que despertam a cobiça e assombram a ordem do poder então estabelecidos. Os ataques a nós, mulheres, e a tudo que representa o feminino são constantes ao longo de toda história. Não é a primeira vez que ateiam fogo em nós. Porém, fogo transforma e queima a matéria, não o espírito. Nesses tempos, é preciso estar forte, não sucumbir ao desânimo. Sorrir, amar, gozar, viver é um dos maiores atos de resistência quando se golpeia o coração do mundo, o nosso coração. Estejam prontas e atentas para o sempre mover e ressurgir, é nossa especialidade!

Nossa dor pela Amazônia é muito legítima, mas é preciso avançar! Não é apenas um salve a Amazônia que irá mudar as coisas. Podemos começar reconhecendo nossa parte golpista, garimpeira, monoculturista, sexista, olhar para nosso “mal” interno. O que em você contribuiu/contribui para o extermínio da Amazônia, da natureza, do feminino em ti e no mundo?

REFERÊNCIAS:
DOS SANTOS, Silmara Aparecida. YKAMIABAS–MULHERES GUERREIRAS: ENTRE MITOS, LENDAS, HISTORICIDADE, GÊNERO E SEXUALIDADE1.
RUETHER, Rosemary Radford. Ecofeminismo: Mulheres do Primeiro Mundo e Terceiro Mundos.
SWAIN, Tânia Navarro. Amazonas Brasileiras? Os discursos do possível e do impossível. Recherches qualitatives, v. 19, p. 1-16, 1999.

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