Tecendo sonhos

Foto: Lucas Bori
Ações do Sebrae capacitam e orientam o artesanato como negócio, tornando rentável o trabalho que conta histórias.

Era apenas uma mãe que gostava de bordar ponto de cruz nas poucas horas livres que tinha dos afazeres
domésticos. Aprendeu pelas revistas de artesanato que lhes chegavam às mãos, utilizando gráficos já
definidos e criou uma linha em toalhas de mesa e banho, panos de prato e enxoval infantil. As peças eram para uso da família ou para presentear amigos. Bordar como negócio, nunca esteve nos planos de Arivânia Pita.

A dona de casa Arivânia Pita, lá atrás a mãe que aproveitava alguns minutos de seu tempo para o hobby do bordado, agora está inserida no mercado comercial como empresária, com marca definida e conhecida em Alagoas e fora do estado.
Foto: Lucas Bori

O passatempo virou paixão e, em casa, sua filha Ariane aprendeu o bordado ainda criança, como se fosse uma brincadeira nova. Todo bebê que nascia na família ganhava uma toalhinha bordada com seu nome, e mãe e filha garantem que essa prática segue até hoje. Só que, agora, com outra assinatura: Bordeliê. O bordado de Arivânia e Ariane é hoje parte do sustento da família através de linhas, agulhas e muito afeto, como definem as duas artesãs.

Foi Ariane quem percebeu que o hobby da mãe poderia render algum dinheiro em casa e ser valorizado pela perfeição e delicadeza do resultado. A princípio, os produtos eram vendidos em grupos de amigas e precificados com uma porcentagem pequena, apenas em cima do custo do material. Elas avaliavam que esse seria um valor razoável para que fosse aceito pelo público. Não consideravam todos os custos do trabalho, inclusive a dedicação e a criatividade da bordadeira.

Em 2019, através de uma amiga, Arivânia e Ariane despertaram o interesse para transformar o artesanato em um negócio “de verdade”. Foram em busca de orientação e acabaram sendo convidadas pelo Sebrae (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para participar da Feira do Empreendedor, um tradicional evento de negócios promovido pela instituição. Foi o início da trajetória que transformaria a paixão em um negócio com alma e identidade, que ganharia o mercado alagoano.

Foto: Arquivo Pessoal

“As consultorias e todo aprendizado que conquistamos no Sebrae transformaram a nossa forma de enxergar o negócio. Em pouco menos de um ano, criamos uma estrutura física para receber clientes, estruturamos nossas redes sociais (grande parte dos clientes vem através do Instagram), estamos sempre participando de eventos de negócio em Maceió e feiras renomadas de artesanato, como a Fenearte, em Recife, e a FNA, em Belo Horizonte” – destaca Ariane

A trajetória do Bordeliê, na verdade, é a história de milhares de artesãos alagoanos. O Estado possui, atualmente, cerca de 18 mil empreendedores que trabalham com manualidade e artesanato.

Busca pelos talentos do artesanato alagoano

Segundo Marina Gatto, analista do Sebrae e gestora das ações voltadas ao setor de artesanato, há 20 anos a instituição trabalha para profissionalizar e qualificar esse mercado, ajudando a projetar a arte de Alagoas para o Brasil e exterior. “Descobrimos o artista, conhecemos seu trabalho, e o ajudamos a ter visibilidade no mercado”, diz, citando como exemplo os moradores da Ilha do Ferro, em Pão de Açúcar, no Sertão de Alagoas, lembrando que recentemente a grife Cantão comprou o uso de imagem do trabalho dos artistas desta comunidade.

Foto: Lucas Bori

“Intermediamos essa contratação e, além de levarmos nosso artesanato, nossa cultura, em roupas de uma grife famosa, os nossos artesãos, de forma justa, recebem pelo seu trabalho”, cita Marina. “O artesão pode ser um empreendedor, seu trabalho pode lhe render o sustento e ser valorizado como arte, cada um deles pode ser um gerador de receita”, enfatiza, contando que muitas vezes é a família inteira trabalhando com obras de artesanato. “É o olhar do empreendedorismo que levamos”, reforça.

Na busca pelos talentos do artesanato alagoano, o Sebrae tem feito o mapeamento, curadoria, capacitação, promoção e apoio à comercialização, tem contado com parcerias importantes para isso, como o poder público e iniciativas privadas. Uma das principais conquistas foi a Indicação Geográfica por procedência do Bordado Filé da Região das Lagoas Mundaú e Manguaba, que teve o Sebrae como incentivador e apoiador em toda a trajetória do processo. O Bordado Filé foi registrado como Patrimônio Cultural Imaterial de Alagoas.

Artesanato premiado

Edvan Alves Lima, também conhecido como Vavan.
Foto: Lucas Bori

No ano passado, onze artesãos alagoanos, de sete municípios, entraram na lista de vencedores do Prêmio Sebrae TOP 100 de Artesanato. A quinta edição da premiação recebeu a inscrição de 1.208 artesãos de todas as regiões do país. Os 100 escolhidos ganharam reconhecimento nacional, além do direito de usar o selo Prêmio Sebrae Top 100 de Artesanato – 5a Edição, que se torna um diferencial no mercado.

Dos onze alagoanos premiados, foram quatro de Maceió, que trabalham com o bordado filé: Lucineide Gomes Barbosa, Maria Cícera Moura da Silva, Petrúcia Ferreira Lopes e Beatriz dos Santos. Dois deles são escultores em madeira, moradores da Ilha do Ferro, Edvan Alves Lima, também conhecido como Vavan, e Camille Souza Dias. De Porto de Pedras vem mais uma premiada, Laudinete dos Santos, com seu trabalho em palha. Amara Lúcia Silva de Oliveira, da Associação Mulheres de Fibra, em Maragogi, foi selecionada com o seu filé produzido com a fibra da bananeira. Em Coruripe, Erica Gomes dos Santos, da Associação das Artesãs do Pontal de Coruripe, venceu com sua produção de objetos na palha de Ouricuri. Ana Cristina Ferreira Santos, de Penedo, foi premiada pelo seu trabalho com bordado livre, reproduzindo cenas do cotidiano nordestino. O time de premiados se completa com o Mestre João das Alagoas, de Capela, que é Patrimônio Vivo do Estado.

“Todas essas conquistas têm transformado a realidade de quem vive do artesanato, principalmente a realidade de mulheres artesãs que se tornaram mais independentes após trabalhar o artesanato como negócio e passarem a ser reconhecidas, virando referência no Brasil.” comenta Marina Gatto.

Negócio com arte

“O Sebrae foi o fundador da minha empresa, fui a primeira artesã do estado de Alagoas a me cadastrar como MEI”, informa a artesã.
Foto: Huebert Missano e Thays Gabrielle

No povoado Murici, zona rural de Penedo, um grupo de mulheres artesãs, lideradas por Ana Cristina Ferreira Santos, transformam lindos bordados em negócios. Com a marca Fulô.A, que faz sucesso nas redes sociais e nas feiras de artesanato em todo país, Ana foi a primeira artesã alagoana a se inscrever como MEI (Microempreendedor Individual). Com a formalização, ela buscou capacitar outras bordadeiras, formando um grupo produtivo que movimenta a comunidade.

“Para mim, artesanato nunca foi hobby, sempre foi trabalho, sou artesã por profissão”, define-se Ana, explicando que a Fulô.A vende para todos os estados do Brasil e outros países, participa de feiras nacionais e exposições. “Descobri o Sebrae através de uma associação na qual eu fazia parte e, em 2014, quando participei do programa Brasil Original, juntamente com consultores, pude desenvolver uma linha onde a minha identidade estivesse presente”, informa.

Ela lembra, com orgulho, de que esse apoio a levou até onde chegou, sendo, inclusive, premiada com o TOP 100 de Artesanato.

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